sábado, 5 de janeiro de 2008

Lisboa-Dakar cancelado!!

"Já vi funerais mais animados", dizia ironicamente um piloto francês à porta do Centro Cultural de Belém. Para os concorrentes que viam, de repente, desvanecer-se um sonho que levara anos a preparar, a consternação era geral. Os condutores dos grandes camiões do deserto, assinalavam a tristeza da partida tocando sonoramente as buzinas, quais navios à deriva, no meio do nevoeiro. Do lado do público que ainda percorria em grande número os quiosques e tendas o ambiente era outro: chegassem os carros a Dakar ou não, aquela parte da festa já ninguém lhes tirava...
Do lado da organização portuguesa da corrida, o ambiente era carregado. Joana Lemos, administradora da Lagos Sport e ele própria ex-participante na prova, dizia "compreender mas não concordar" a decisão da empresa organizadora, os franceses da ASO. "Pelo nosso lado faremos tudo para salvar o Dakar e para que, para o ano, ele volte a partir de Lisboa".
Escusou-se a avançar com qualquer estimativa dos prejuízos, já que "os números são tão grandes que seria sempre especulativo referir números". Um desses custos é o da montagem da prova no terreno. Há uma semana que a pista estava a ser marcada e as bancadas, zonas-espectáculo e estacionamentos a serem preparados no Campo de Tiro de Alcochete. "Ainda me custa a crer que amanhã às 08.30 não vão lá passar carros", desabafava Alberto Gonçalves, elemento da organização responsável pelo traçado.
Joana Lemos não põe em causa os alertas dos serviços de segurança franceses mas não se conforma com a anulação total da prova. "Nem quando o Thierry Sabine (criador desta corrida) morreu (num acidente de helicóptero durante uma tempestade de areia em 1986), o Dakar foi interrompido". Em diversas situações e, por motivos de segurança ou desportivos "houve etapas anuladas, mas nunca a prova toda". De resto, as autoridades mauritanas fizeram, entre ontem e hoje, um derradeiro esforço, que incluiu a deslocação do Ministro do Turismo a Lisboa, procurando provar que tinham meios para garantir e reforçar a segurança da prova.
A 24 de Janeiro houve quatro turistas franceses mortos na Mauritânia, aparentemente por um grupo islamita radical vindo da Argélia. Até que ponto este episódio é um sinal global de insegurança? Syndiely Wade, filha do presidente do Senegal e participante em cinco edições do Dakar (este ano dividiria o volante de uma pick-up, com a filha do ex-piloto Jacky Ixx, Vanina) tem dúvidas. "Este ano, em Agosto estive na Mauritânia a treinar e o ambiente era tranquilo". É certo que, ao longo dos últimos anos, ouviu falar de recontros e mortes entre tropas mauritanas e fundamentalistas junto à fronteira com a Argélia. Contudo, até ontem, não lhe parecia existir "nenhuma ameaça significativa". Reconhecendo que os serviços de informação franceses "são muito bem organizados" e "não teriam avançado levianamente com um alerta" manifesta algum pessimismo. "Há que ser coerente. Se a ameaça existe este ano, também existirá para o ano porque a Argélia continua no mesmo sítio". Logo, vê com apreensão "o futuro do Dakar".
Embora já não participe na prova há mais de 20 anos, José Megre, bom conhecedor de África, acaba por emitir uma opinião semelhante. "Era um milagre ainda se conseguir passar na Mauritânia sem problemas, com tanta gente armada naquela zona". Os problemas começaram em 1992 com a guerrilha Touareg. Depois veio a o fundamentalismo armado na Argélia. "Naquela zona é fácil passar de um país para outro, dar um golpe de mão e regressar". Por isso, admite que se possa estar perante o fim do Dakar, já que o traçado depende, essencialmente da Mauritânia. Por outro lado, "sei, por experiência própria, o efeito tremendo que um revés pode ter na credibilidade de uma organização de provas".Também pessimista, Alberto Gonçalves admite estarmos perante "o fim do Dakar, pelo menos com o figurino que lhe conhecemos".
fonte:Expresso


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